Candidato à presidência da república, Gouveia e Melo esteve à conversa, em exclusivo, com o VivaCidade.
Numa entrevista recente foi-lhe perguntado em que Presidente se revia, referiu Mário Soares. Que atributos encontra no ex-Presidente para justificar a sua resposta?
Quando essa questão foi colocada não pensei tanto no Presidente em si, mas no homem. Tendo isso em conta há dois nomes em que me revejo, Mário Soares e o General Ramalho Eanes.
Foram os dois grandes constituintes da democracia. Ramalho Eanes fez a transição dos militares para a parte civil, colocando os militares nos quartéis. Mário Soares solidificou a democracia. Não tem nada a ver com esquerda ou direita.
Respeito homens de coragem e estes dois homens foram de elevada coragem, seja moral ou física. Nos momentos em que foi preciso “deram o corpo às balas”, como costumamos dizer nas Forças Armadas.
São características essenciais para o desempenho do cargo?
O nosso futuro é muito incerto. Temos uma guerra na europa que não sabemos como vai acabar.
Temos um sistema internacional que está a implodir, não só em termos da defesa e do confronto estratégico, mas também de organização económica mundial que pode afetar fortemente a nossa economia, e andamos todos tipo avestruz a tentar não perceber o que se passa à nossa volta.
Tendo isto em conta considero que o próximo Presidente terá de ter essas qualidades que referi do General Ramalho Eanes e de Mário Soares.
São qualidades que têm de ver com visão, basta ver, por exemplo, que foi Mário Soares que nos colocou na União Europeia, CEE na altura.
É preciso ser também organizado, ter coragem, não olhar para o país de uma forma fraturada porque para isso já temos as fraturas partidárias.
No topo da pirâmide do poder político temos de ter alguém que una.
É isso que pretende ser, um Presidente que una?
Sim, é isso mesmo que quero ser, um Presidente que una, que ajude Portugal a transformar-se em algo melhor, deixando as carruagens do fundo da europa e passar para as da frente.
Tudo isso implica coragem, não ter hesitações nos momentos certos, não ser um cata-vento, ter um rumo constante, e envolver a população como um todo, sem fazer demagogia ou cair em populismos. Temos de ser agregadores de uma população com a verdade.
A nossa população não deve ser infantilizada, os problemas que temos devem ser colocados de forma clara à população para resolvermos esses problemas em conjunto com coragem, determinação e com a coragem que é reconhecida a todos os portugueses.
Considera por isso que a sua experiência militar é mais importante que a experiência política?
A minha experiência militar o que traz para aqui é ter moldado a minha personalidade e forma de estar na vida. Deu-me disciplina, exigiu-me integridade, capacidade para trabalhar em sistemas complexos, coragem, visão, capacidade para lidar com pessoas de todos os géneros e estratos, bem como negociar muitos processos.
Para mim, a experiência política, com um P grande, é solucionar problemas para a comunidade. Com o P pequeno é focar-me na pequena intriga, no interesse de determinado grupo ou partido, no calculismo de tomar decisões a pensar que podem ajudar este ou aquele partido… isso é o facciosismo partidário que não gostava de ver na presidência da república.
Esse facciosismo já tem um lugar e a Constituição dá-lhe a exclusividade, chama-se Assembleia da República e em consequência o poder executivo que é o Governo.
Não vamos partidarizar toda a vida política. A minha experiência anterior deu-me características de comportamento e moldou a minha psique para enfrentar problemas que vêm aí.
Acredito que posso ajudar os portugueses e Portugal a enfrentar com seriedade os problemas, sem politiquices, a olhar para os problemas com informação verdadeira que me permita tomar decisões pelas quais depois me responsabilizarei.
Enquanto militares aprendemos que os erros do grupo são nossos porque somos os dirigentes.
Não trago nada de mau dos militares, nenhum bicho mau. Trago atitudes e formas de estar que funcionam e que podem ajudar este país num momento de crise. Sendo eu um civil neste momento.
Um dos aspetos que tem referido é que em Portugal falta organização. No trabalho que desenvolveu durante a campanha de vacinação da Covid-19 esse foi mesmo um dos pontos mais valorizados, a forma como organizou o trabalho. Como Presidente acredita que pode ter esse papel de orientador de uma organização que o país precisa?
Sim, é possível apesar de este ser um cargo não executivo.
Com a sua capacidade de análise, o seu foco, o magistério de influência e as conversas com o Primeiro-Ministro, pode ser um grande auxiliar à governação.
O Presidente não deve usar o cargo para fazer oposição ao Governo, nem para lhe fazer amém, é um verificador do sistema que deve exigir uma boa governação, aconselhar e interagir com o Governo.
É natural que o Presidente e o Governo, em determinados momentos, possam colaborar para o bem do país.